segunda-feira, 21 de maio de 2012

ELEMENTOS DE TEMPO E DE ESPAÇO



História, tempo, lugar.


Onde aconteceu? Quando aconteceu? As histórias geralmente apresentam características de tempo e lugar. O que acontece, acontece em algum (s) lugar (es) e durantes algum(s) momento(s). Ao contarmos, as situações se desenrolam em certas circunstâncias de espaço e de tempo: o onde e o quando da história. O modo de acontecer a ação, a representação da personagem, bem como a caracterização do espaço em que se passam as situações, são importantes dimensões descritivas dentro do contexto narrativo. Em alguns casos,, o lugar é imprescindível para a construção da hitória. Por exemplo, nos romances regionalistas. O mesmo ocorre com o tempo;por exemplo, nos romances histórico. Ou as narrativas de introspecção, de sondagem intimista, que contam o mundo interior das personagens. O chamado tempo psicológico, tempo da duração interior dos acontecimentos. Essa temporalidade interior da duração-vivência se diferencia do tempo cronológico, como sabemos, o tempo da natureza, que é marcado pelos relógios- manhã-tarde- noite etc. A diferença entre o tempo cronológico e o psicológico pode ser observada com muita clareza em nossa vida cotidiana quando sentimos que certos momentos se passam com maior ou menor velocidade. Há também o espaço psicológico, o espaço interior, os inumeráveis lugares de nossa vivência, dentro de nós. Assim também as nossas personagens; elas vivenciam um universo subjetivo, que pode ser expresso nas histórias – um mundo interior que contém muitos espaços interiores e muitas durações interiores.
Serenata sintética
Cassiano Ricardo
  Lua morta
  Rua torta
  Tua porta

Insólito aconteceres
Sueli Aduan
Era só uma porta, porém, fechada. Não fosse o esquecimento do número, exatidão de mundo a mim distante, e uma pequena movimentação nos corredores eu diria que minha figura ali era no mínimo risível. A angústia que seguiu à abertura da porta, ainda que rápida, povoaram minha mente de recordações da infância, e eu relembrei meu pai sempre sentado em muros, muretas, corredores; minha mãe sempre a gritar com o cachorro que, porta aberta, adentrava em busca de um afago, um carinho. Sempre as portas. Sempre essa busca. Seres frágeis que somos sedentos de beijos úmidos, palavra e poesia, sussurros noite adentro. Esse insólito do viver.


Observe a diferença de duração temporal nestes dois textos. No primeiro, o sentimento de abandono, a solidão, a saudade eternizam o andar pela madrugada, sob uma lua morta. No segundo há uma aceleração do tempo, um ritmo de ações que se sucedem tão rapidamente quanto a imagem pressentida por detrás daquela porta... Devaneios, interioridade.

PROPOSTA
DATA DA POSTAGEM  05/06
Crie uma história a partir de uma das seguintes frases de Carlos Drummond de Andrade
• Perdi o bonde e a esperança, volto pálido para casa;
• No elevador penso na roça; na roça penso no elevador;
• Meu coração vai molemente dentro do táxi.

quinta-feira, 17 de maio de 2012


DO TOQUE AO REAL

O sorriso dela brincava na face tosca das mulheres dos colonos, escorria pelo verniz dos móveis, desprendia-se das paredes alvas do casarão.
 Murilo Rubião


Corpo ereto, cabelos cuidadosamente desarrumados, ar blasé, e vestida de vermelho ela descia as escadas lentamente. Além de  um sorriso estampado na face como se mil sóis nela habitassem.  Equilibrava-se no salto da sandália preta  e nem  ousava segurar no corremão. O esmalte ainda úmido podia borrar. E se tinha uma coisa que ela não admitia era mulher descuidada. Costumava dizer que era natural esse cuidado todo. Ato corriqueiro, quase automático. Não gostava de chamar atenção, e, quanto aos elogios que recebia: — bela, deslumbrante, magnífica. Apenas sorria.  


Mas se deixava levar toda orgulhosa.  Puro delírio. E era compreensiva, dessa compreensão  exacerbada, irreal. Sabia que nem toda mulher podia se dar a esses pequenos luxos, e na sua imensa delicadeza segredava à amigas seletas: — entendo perfeitamente, é uma questão de tempo. E se tinha uma coisa que ela não abria mão era da sua liberdade. Levantava cedo só para ter o prazer de ler o jornal, das notícias que aconteciam do outro lado do mundo. Um cachorrinho perdido, uma mata destruída....tudo lhe interessava. Botânica, gastronomia, moda, filosofia, literatura, cinema...

E naquela noite, como em tantas outras, descia lentamente as escadas mais bela que nunca. Pronta para mais uma deliciosa festa noite adentro. Era tudo que queria ,que precisava. Viver, dançar, sorrir.  Ser. E num gesto tresloucado, inesperado seus dedos tocaram com força o corremão. Com o esmalte todo borrado um olhar vago, distante, úmido e as mãos trêmulas, acordou.
O dia amanhecia lá fora. Era preciso correr.




quarta-feira, 16 de maio de 2012

Renovações

Acordou cedo, olhou-se no espelho, atentou-se para os cabelos loiros, cacheados, longos, olhou para seu rosto, a pele alva e sardenta, pequenas linhas de expressão ( não deveria ter sido tão relapsa com o protetor solar, pensou).
Mas apesar de tudo, achou que estava bem apesar dos 42 anos e dois filhos, era magra e alta, uma mulher atraente, de porte clássico, tinha uma vida abastada.
Pensou na vida que levava, no seu dia a dia... cuidava na casa, filhos longe, na faculdade, marido trabalhava muito, quase não ficava com ela, estava vazia, tantos planos deixou para cuidar da família!
Não se arrependia, mas agora queria algo mais para preencher seu tempo, sentir-se viva, fazer algo para ela... mas o que seria?
Criou coragem, ligou para o cabelereiro, cortou-os bem curtos e pintou-os de preto, saiu do salão e matriculou-se em um curso superior, finalmente seria advogada! bastaria a dedicação para o vestibular.
Comprou roupas novas e de um estilo totalmente adverso do que costumava usar... chega de ser básica, cara lavada, sem cor!! quero colorir minha vida enquanto há tempo, realizar meus sonhos, tornar-me útil para mim mesma, foi assim matutando para a casa.
Contou para o marido, que apesar do espanto, aprovou as mudanças.
Á noite, antes de dormir, olhou-se no espelho novamente e viu uma outra mulher... a mesma pele alva e sardenta, mas as linhas haviam suavizado, o olhar brilhava mais, havia vida naqueles olhos claros agora, havia esperança de renovação, não só da aparência, mas também do espírito, da alma.
Na manhã seguinte foi à livraria comprar material para iniciar os estudos.

Carina.

terça-feira, 15 de maio de 2012

Mariama.
















Mariama. 

1“O sorriso dela brincava na face tosca das mulheres dos colonos, escorria pelo verniz dos móveis, desprendia-se das paredes alvas do casarão”. Tudo em sua volta cheirava um pouco de alecrim do mato com alfazema, perto dela as coisas adquiriam um colorido fascinante e poder-se-ia, sentir o frescor da gruta, onde nascia a água pura e cristalina, que seguia sinuosamente por varas abertas de bambu até a porta da cozinha da casa. Sua voz suave e terna fazia lembrar cantigas para ninar crianças. Vinha dela um magnetismo, que nos envolvia e seduzia.

Assim era Mariama, uma linda mulher que morava naquele casarão branco avarandado de dois pavimentos, que se destacava naquela estrada poeirenta, que se ligava a estrada férrea para a capital. Poder-se-ia ver uma longa escada de madeira, que terminava no fim da varanda, em seu corrimão pendentes vasos a enfeita-lo, todos com suas flores silvestres que inspiravam uma tela de pintor com a figura de Mariama debruçada na varanda, com sua longa cabeleira caída sobre os ombros que balançava com o vento de Maio, tudo aquilo nos envolvia com graça e emoção.

 Com sua voz inimitável estava sempre a cantarolar canções românticas, que falavam de amores perdidos e desilusões amorosas, o que contradizia com seu semblante leve e alegre com aqueles olhos negros e brilhantes como as estrelas naquele lugar de noites estreladas.  Sabedora da admiração ela sempre esboçava um sorriso provocante aos passantes daquela estrada. Mariama era a figura fugida de uma tela de pintor renascentista.

Hoje quem passa pelo casarão ainda se vê uma fumaça, a escada sem flores, apenas uns gatos espreguiçadores pelas escadas e varanda. Por certo não mais verá Mariama, que numa manhã seguiu a estrada e num trem de ferro foi parar na capital, sem um olhar para trás, para que nada lhe fizesse recordar os olhares apaixonados que por ali ficaram.

·         1-Citação de Murilo Rubião em a Flor de vidro.

Toninho.
Texto para a proposta criar um personagem com base na citação de Murilo Rubião, idealizada por Sueli Aduan.
Grato sempre amiga Sueli por nos permitir exercitar por aqui.

segunda-feira, 14 de maio de 2012

João da Ponte.
















João da Ponte.


“Era um homem alto, magro, sempre vestido com cores escuras,
Andava meio de lado. Tocava as coisas lentamente. “

Parecia carregar seus mortos e ou decepções do passado, este mulato curtido pelo sol, de mãos enormes povoadas por calosidade adquirida no serviço da lavoura. Conhecido como o João da Ponte, referencia ao lugarejo onde nascera naqueles anos que antecederam a ditadura Vargas. Assim vivia pelas ruas de pedras, daquela pequena cidade de Minas Gerais, este homem de maneiras delicadas, sempre com um sorriso amigável, que fazia questão de tocar as mãos das pessoas com uma expressão facial de menino inocente.

Naquele tempo, nas igrejas católicas ligadas à Arquidiocese Mariana, proibia-se mulheres de adentrarem nas igrejas com blusas sem mangas ou muito decotadas. Para tal um homem era designado para a tarefa, ficava na porta da igreja como sentinela, foi então, que o João pela sua delicadeza e cordialidade fora designado e era o responsável nas missas dominicais das 8 horas, que tinha maior numero de mulheres e crianças. 

Algumas mulheres que vestiam roupas sem mangas, quando chegavam à porta da igreja, se valiam de um véu negro ou um xale que colocavam sobre o tórax, fazendo cobrir as parte nuas e assim burlavam a restrição. Ocorre que João não aceitava esta situação e num belo domingo, ele impediu a mulher do prefeito e fez-se um maior “fuzuê” na porta da igreja, que só fora desfeito com a presença do delegado, do bispo e do juiz de paz, que estavam na igreja. 

Depois deste episodio, o que se sabe deste fiel cumpridor das ordens do padre, que permanecera triste e “acabrunhado,” assim desapareceu da cidade e nunca mais se teve noticias dele. Alguns andaram dizendo em porta de boteco, que contrariado ele se mudara para o Vale do Jequitinhonha e morava na cidade de Mucuri, e que agora era um “obreiro” de uma igreja evangélica que estava em processo de instalação. 

Toninho.
10/05/2012.

Fuzuê: confusão, algazarra, baderna, celeuma.
Xale: vestuário feminino, adorno para os ombros, manta feita de seda ou lã.
Acabrunhado: abatido, triste, envergonhado,
Obreiro: auxiliar de pastor.
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Aprender é minha profissão. Criticas me ajudam.
Fique a vontade. 
Obrigado Sueli pelo espaço e idéias de postagens.