quarta-feira, 16 de março de 2011

O Poeta e a Lavadeira


Neste momento, numa rodada de amigos e admiradores, o poeta declamava o mais belo poema, uma obra prima. Foi um assombro... A poesia estava deixando todos extasiados! Que beleza!

Eram idéia profundas, as palavras, as frases tão suaves e arrebatadoras que os ouvintes estavam estupefatos e estáticos. Ninguém se mexia . Atenção total. E quando o poeta, no auge do entusiasmo, declamava a mais grandiosa estrofe do estupendo poema, ouviu-se uma batida na porta da sala. O poeta inspirado elevou o tom da voz, e de forma mais vibrante tentava abafar o ruído do inoportuno visitante.

Persistem, porém, na porta, as batidas indiscretas. Contrariado pela interrupção o poeta de uma forma intempestiva abre a porta violentamente. “ Por favor Sr. Poeta, a sua roupa suja! ___ diz um vozinha tímida, saída dos lábios de uma menininha magricela. Era a filha da pobre lavadeira. “ Agora não posso menina!... venha amanhã!” . “ Mas... a mãe fica sem serviço... e sem pão... somos tão pobres... por favor, Sr. Poeta, sua roupa suja”. “ Não posso, já disse!... E de forma estúpida e grosseira fecha a porta na cara da menina.

E, retornando o poeta, recomeça a declamar. Entre aplausos e ovações termina de forma gloriosa. Felicitações, abraços, sorrisos, elogios. Alta madrugada, surge o rosto pálido e faminto de uma menina paupérrima. Corre os olhos sonolentos pelo quarto, apanha da mesa os originais do poema e rasga-o em mil pedaços jogando-os no cesto de papéis, murmurando, “ Roupa suja” . E desaparece.

O poeta acorda assustado. Procura pelos originais! Estão intactos... começa a refletir! Será verdade que escrevi este poema? Um poema que fala de humildade, amor ao próximo, caridade, desapego das coisas materiais, enfim palavras enaltecedoras da condição humana . Se é verdade por que não entreguei à pobre menina a minha roupa suja? Por que preferi ao invés disso alimentar o meu ego e a minha vaidade?

Levantou-se, mesmo tarde da noite, atravessou metade da cidade e foi entregar a roupa suja na favela onde morava a lavadeira... e lavou com lágrimas de arrependimento a “ roupa suja” que tinha dentro da alma . Agora assim, seu coração declamou, em silêncio, o mais lindo poema da humildade.

7 comentários:

  1. ...seu coração declamou, em silêncio, o mais lindo poema da humildade.

    Tristes personagens!mas com um final feliz.rs. Uma boa história, Santiago.

    abração

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  2. Temos muitos que escrevem belas poesias, lindas palavras, mas faltam as lágrimas para lavar sua alma...

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  3. A intolerancia é um prato frio,que faz mal terrivel ao estomago e a alma,mas como tudo nesta vida,sempre há tempo de escolher um prato mais saboroso,como da tolerancia e da humildade,o poeta reconheceu e ainda pode ter uma feliz digestão.Belo conto com uma bela reflexão sobre comportamento.Umm abraço de paz Santiago.
    Suely as postagens estão interessantes.

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  4. Só poso concordar,Toninhobria. As postagens estão muito interessantes, e sinto que há um "cuidado" de todos para desenvolver ,cada um com seu "estilo", a proposta do exercício em questão.
    E, esse é o grande "lance da oficina". :o)
    abraços.

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  5. Eu estou curtindo pra caramba essa oficina. Nem preciso mais comprar livros. Tô economizando. Além do quê conhecendo um monte de escritores novos e muito talentosos. Como a Sueli disse: cada um com seu estilo.

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  6. Fico muitoooooooo feliz, "curta mesmo" Lailin. Mass não me responsabilizo com essa atitude, não :- parar de comprar livros,imageine!!! rs.
    Ao contrário, espero que a Oficina "desperte" cada vez mais para tudo que envolva o ato de ler/escrever....
    E é preciso muito cuidado com os conceitos: estilo/inspiração/sensibilidade em nome deles há muita merd.. por aí.
    bjão Lailin

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  7. Nem todos os personagens são felizes, nem tudo na vida é belo e feliz. Foi por este caminho que fui. É necessário que se desmistifique essa lenda de que poetas e escritores tem uma vida de glamour, exceto os que nasceram com pé na glória. Muito obrigado pelas palavras, Toninho. Abraços@

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